Gosto de contar histórias.
Gosto, ainda mais, de contar histórias sobre livros.
Este livro aqui tem uma história que entrou para a minha história.
Vamos a ela!
Minha filha começou a ter contato com os livros desde muito cedo.
Eu passei boa parte da gestação lendo para nós duas, em voz alta.
Eu lia fábulas e histórias oriundas dos mais diversos lugares do mundo.
Quando ela nasceu, eu continuei com essa prática de leitura.
Criamos o hábito de sempre ler um livro ou alguns capítulos antes dela dormir.
Ela foi crescendo e, aos três anos, mais ou menos, incluí em nossa rotina visitas semanais à biblioteca do bairro.
Lá, havia uma senhora que, todas as sextas-feiras, passava uma meia hora lendo para as crianças.
Todas as sextas-feiras era então dia de biblioteca!
Era dia de pegar novos livros que seriam muito bem lidos durante a semana.
Assim ela foi crescendo, na companhia de leituras, livros e leitores!
Depois que ela começou na escola, e quando já sabia ler sozinha, notei que o interesse pelos livros foi decaindo.
Compreendi que isso ocorreu por conta do esforço da alfabetização e da adaptação ao sistema escolar.
Como ela já passava as manhãs inteiras às voltas com textos na escola, era de se compreender que, em casa, ela quisesse fazer outras coisas para espairecer. Muito natural!
As visitas semanais à biblioteca foram deixando de ser interessantes porque as sessões de leitura se dirigiam a crianças mais jovens.
Agora ela queria passar mais tempo em casa brincando, jogando ou assistindo a programas na televisão ou em vídeo. Ela continuava amiga dos livros, mas não como antes.
Claro que comecei a me preocupar com isso e tentei, pelo menos, manter vivo o hábito de ler um pouco junto com ela antes de dormir.
Em algum momento passei a usar a seguinte estratégia: eu lia um capítulo e ela lia outro, assim íamos alternando a leitura e eu aproveitava parar tentar mostrar a ela que os livros são interessantes, que eles têm coisas fascinantes para nos mostrar, coisas que não podemos descobrir só assistindo a interpretações alheias prontas que recebemos, por exemplo, na forma de filme.
É que um filme já traz embutido nele a visão de quem o fez, de quem escreveu o roteiro, etc.
Filme é uma linguagem; texto é outra, completamente diferente.
As duas linguagens às vezes se complementam; outras vezes, não.
"Por que não experimentar as duas linguagens? Podemos ler juntas o livro e depois assistir juntas ao filme que se baseia nesse livro, que tal?“ - propus a ela.
Assim lemos juntas Peter Pan, Pinóquio e tantos outros.
Outra estratégia para estimular a leitura foi promover um tipo de concurso entre ela e o pai - eu fui excluída desse concurso porque ninguém aqui em casa pode concorrer comigo quando o tema é leitura.
A estratégia da leitura alternada e compartilhada - alinhada à idéia do concurso - funcionou bem por um tempo, mesmo assim notei que faltava nela um desejo autêntico pela leitura.
Tentei dar tempo ao tempo, pois a última coisa que se deve fazer quando se quer ver um leitor florescer é tentar impor o que quer que seja.
Então um belo dia o acaso me levou a trabalhar na organização de uma feira de livros infanto-juvenis.
Lógico que minha filha não quis ir comigo à feira, porque naquela fase ela estava achando que o livro era uma coisa muito chata…
Nessa feira de livros, conversando com uma outra mãe sobre como motivar a leitura nas crianças sem forçar a barra, ela me sugeriu que eu desse para a minha filha quaisquer dos volumes da série "Die Schule der magischen Tiere“, de Margit Auer.
A tradução literal do título para o português seria mais ou menos "A escola dos bichos mágicos“ ou a "A escola dos bichos fantásticos“.
O livro tem ilustrações de Nina Dulleck.
Margit Auer é jornalista (ou repórter) e escreveu (escrevia ou escreve) para grandes jornais e portais de notícias alemães.
Enquanto ela acompanhava o crescimento dos três filhos, ela leu muitos livros infantis.
Um belo dia, se viu com vontade de escrever um.
Daí nasceu a série "A escola dos bichos mágicos ou fantásticos“.
Sim, comprei então o volume 10, que estava à venda na feira, e levei para casa.
Cheguei em casa e disse para a minha filha: "Eu te trouxe algo“.
Sabendo que eu vinha de uma feira de livros, ela me olhou meio desanimada e disse: "Já sei, livros…“
Eu não me deixei abater e confirmei: "Sim, me disseram que este aqui é muito bom. Experimenta!“
Deixei o livro em cima de uma mesa.
Em algum momento ela foi lá e pegou o livro, abriu e começou a lê-lo.
Eu fui cuidar das minhas coisas e a deixei com aquele objeto tão "sem atrativos“.
Chegou a hora dela dormir e ela me disse: "Vou ler mais um pouquinho, tá?“ - e levou o livro consigo para a cama.
No dia seguinte, quando eu voltei para casa já quase no final do dia, a surpreendi lendo, e muito interessada aliás.
Ao final da noite ela me disse: "Massa! Quero outro volume!“
Eu quase não acreditei no que estava ouvindo…
Ela estava lendo sozinha, o livro tinha mais de 200 páginas e ela o havia devorado em uma noite e um dia! Uau!
Ela me contou a história e eu comprovei que ela, de fato, havia lido todo o livro.
Morri de vontade de dar um abraço na Margit Auer e dizer: "Mulher, você sabe escrever! Respekt!“ - Isto é o que se costuma dizer em alemão quando se quer expressar respeito e admiração por alguém ou por algo.
De lá para cá, senti que minha filha voltou a gostar da companhia dos livros.
Agora estou tendo que cavar tempo para, além dos meus próprios livros, ler também o que ela está lendo, para que possamos trocar figurinhas a respeito.
Ela começou pelo volume 10, o mais recente, e já leu quase todos os volumes anteriores.
Eu acabei de começar minha aventura pelo volume 1.
E ela tem razão, o livro realmente é muito bom!
Reproduzo aqui o que ela achou da leitura do volume 1, já que a opinião dela pesa mais do que a minha:
Tradução: "Eu achei o livro super (bom) porque (agora eu sei como) os primeiros bichos fantásticos encontraram os seus (cuidadores) humanos".
Neste primeiro volume começamos a conhecer cada uma das crianças que formam a classe da professora Cornfield.
Miss Cornfield veio da Escócia e tem, junto com seu amigo Mr. Morrison, um projeto muito especial para a classe, um projeto que envolve os bichos mágicos ou fantásticos.
No tempo adequado, cada criança vai sendo designada ao seu bicho fantástico.
Claro que entre a criança e seu bicho tem que haver uma relação muito especial.
O que eu mais gostei neste volume foi observar que o texto trata com respeito as crianças e não banaliza seus problemas, que são todos problemas da vida real de crianças da mesma faixa etária dos personagens.
É um texto sóbrio, super bem escrito, descomplicado e fluído.
Resultado? Fantástico!
Só posso recomendar!
Die Schule der magischen Tiere, Band 1, Margit Auer. Ilustrações de Nina Dulleck. Editora Carlsen.
Foi traduzido em Portugal como O Colégio dos Animais Mágicos, editora Booksmile.
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Que generosidade a sua de compartilhar a experiência e se doar de alma e tempo para formar essa leitorinha. Amay.
ResponderExcluirQue show o teu testemunho de como formar uma leitora. Meu pai lia histórias para mim antes de eu dormir quando era criança. Minha mãe conta que também lia, mas me lembro mais dele. Sei que quase quarenta anos depois daquilo, eu já estava com dois romances publicados na Amazon (Um Pouco Eterno e Doces Meninas Com Quem Passei Uma Temporada No Inferno) e estou escrevendo o terceiro. Sim, ler é bom. ;) Abraço grande, amiga!
ResponderExcluirFiquei curiosa para ler, vou procurar pelo livro.
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